Pages

domingo, 2 de novembro de 2008

Gente da minha terra...



Lembro-me de quando era pequena pensarmos em Fado como algo que não era nada 'fixe', como algo que usávamos para descrever alguém a quem faltava o factor 'cool'. "Ah e tal é um cromo deve ouvir fado!" e coisas do género.


Eu cresci a ouvir fado. O meu pai ouve muito e canta muito também. Canta em casa, embora eu sempre achasse que ele tinha uma boa voz para se aventurar mais em noites de fado e assim. Eu nunca liguei muito ao Fado, mas hoje reconheço muitos fados graças ao meu pai e a sua mania de nos acordar aos sábados de manhã com os seus discos a tocar. Lembro-me de muitos fados que ele ainda canta, todos tristes e com histórias terríveis que me faziam arrepiar entre os lençois da cama quando o ouvia cantar aos sábados de manhã. Histórias de crianças envenenadas com bolos destinados aos cães dos vizinhos, pais de familia que roubavam para alimentar a familia mas que estavam arrependidos, pais que morriam na guerra ao imaginar as filhas a dizer 'papá'. Enfim, um rol infindável de histórias tristes que sacavam lágrimas ao mais forte lá do bairro.


Cresci sempre de costas voltadas ao Fado, pois não era 'fixe' e os posters da Amália não ficavam nada bem nas paredes do meu quarto.

Até que descobri a Mariza, que me fez re-descobrir o Fado. Vá, podem dizer à vontade que não sou 'fixe', mas já vai bem longe o tempo em que me importava com isso.


Ontem fui ver Mariza ao vivo ao Barbican Centre. Claro que encontrámos muitos portugueses por lá, mas também muitos ingleses em um de dois concertos esgotadíssimos em Londres. Mariza tem uma excelente presença em palco, interage com o público e com os músicos lindamente e ainda conseguiu ensinar os ingleses a dizer ''Guitarrada''. Confesso que tinha algumas dúvidas sobre a voz dela, era um pouco céptica em relação à sua voz ao vivo, mas confesso que engoli todas as dúvidas, Mariza tem de facto uma voz magnifica. Tão magnifica que calou o Barbican Centre ao cantar uma música sem microfone. Impressionante.

O Fado não tem de ser triste, e exemplo disso foi o final do concerto, em que Mariza colocou a audiência de pé a cantar e a dançar 'Rosa Branca'. Muito bom. O Fado não é só sobre saudade, sobre mágoas e tristezas. O Fado também pode ser feliz e fazer-nos felizes.


A ideia de que 'Portuguese do it better' pode bem não ser sempre verdade, mas muitas vezes é. Só é pena nós, os portugueses, não nos apercebermos disso na maioria das vezes.


Mariza, a primeira portuguesa a cantar no David Letterman's Show:



Se isto não vos deixa orgulhosos, não sei o que deixará.