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domingo, 19 de setembro de 2010

Charlie and the Chocolate Factory

Eu nunca fui uma rapariga com o dom da culinária. No geral, safo-me, mas não tenho umas mãos de fada para fazer cozinhados - os meus cozinhados são (a maioria das vezes) mais que comestíveis mas não são nenhum manjar dos deuses. Gosto de pensar que tenho outros atributos!

Quando comprámos a nossa casa, fiquei inspirada para ser fada do lar. Melhor, fada da cozinha. Comecei a coleccionar receitas, e em equipa experimentámos e descobrimos receitas óptimas, que ainda hoje fazemos. Mas a minha melhor obra de culinária sempre foi o bolo de chocolate. Mais uma vez, mais que simplesmente comestível, mas provávelmente não será o melhor bolo de chocolate do mundo. O que é bom, porque aparentemente andam muitos desses para aí, basta ver a ementa dos restaurantes que têm a mania que são engraçados e lá estã ele, entre o doce da casa e o pudim da avó.

Para mim, e mais importante ainda, para o meu rapaz, é um bolo muito bom. E isso chega para me sentir orgulhosa do meu bolinho.

Quando vivia em Lisboa, fazia-o muito. Em Londres, a falta de utensílios como deve ser (aiii que saudades da minha cozinha em Lisboa) não me tenta a fazê-lo com frequência. Alem disso, das vezes que tentei fazer um bolo por esta bandas, algo não correu bem e os bolos ficam assim tipo bolo lilliputiano - pequenino, pequenino. Dependendo do meu humor, culpo a farinha inglesa ou a potência do nosso forno.

A semana passada, fiz uma espécie de ultimato à farinha e ao forno inglês. Era o derradeiro teste, do qual dependia as minhas futuras tentativas de fazer bolos em Londres. Se não resultasse, arrumava a espátula e a forma do Ikea, e não me aventuraria a fazer mais do que scones durante o Inverno.

Mas meus amigos, depois de 4 aninhos, voltei a ter o prazer de ter um bolo com tamanho de gente, e cara de gente, e não um bolo com o sabor concentrado em 3 centimetros. Esta experiência deu-me alento, e hoje, armada de ingredientes portugueses comprados na merceria portuguesa em Camden Town (já vos disse que os ingredientes ingleses não são de confiança) eu misturei, mexi, bati, barrei, cozi e voilá!

O meu bolinho de chocolate está de volta, maior que o normal e tudo, e sei que o sabor continua (quase) o mesmo, a julgar pela cara de satisfação do maior critico culinário do mundo - o meu quase marido!

Prova superada! Olhem que eu já vi casamentos serem cancelados por menos que isto....


Antes de ir ao forno: a ansiedade, o nervoso-miudinho, a dúvida...

Acabadinho de sair do forno...a satisfação de constatar que tem mais que 3 cm...


E finalmente, já com cobertura. À hora que vos escrevo, já lhe falta umas fatias...

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Lisbon Revisited (2010)

Quando escrevi o post abaixo, foi com a intenção de escrever este logo de seguida. Mas como raramente consigo escrever neste blog com a regularidade que desejo, tal não aconteceu.

Mas aqui vai, mais vale tarde do que nunca.

No passado mês de Junho, em plena euforia do Mundial (antes do desgosto de sermos eliminados pela Espanha) fui a uma declamação de poesia de Fernando Pessoa, parte dos eventos do City of London Festival de 2011, que este ano teve como tema Portugal e os países lusófonos.

Num dia de bastante calor, lá fui eu, sózinha com os meus botões, dado que sendo dia de jogo da Argentina (que na altura ainda era uma séria candidata) ninguém optou por me fazer companhia num fim de tarde a ouvir Pessoa e a beber bom vinho português. Acharão que um fim de tarde com Maradona é bem mais produtivo.
O evento contou com participações de Inês Pedrosa (presidente da casa Pessoa em Lisboa), o Dr Seabra Pereira da Universidade de Coimbra e Richard Zenith, o líder mundial em tradução de Pessoa para a língua inglesa, assim como um dos maiores conhecedores do poeta fora do nosso país. Zenith falou um pouco da história de Pessoa e dos seus heterónimos, lendo depois alguns poemas em inglês.
Foi algo muito interessante e que me encheu de orgulho lusitano, ver um americano falar de Pessoa com um entusiasmo tal, que se notava um brilhozinho nos olhos e não conseguia disfarçar o sorriso entusiasmado.
Um pouco menos interessante foi ouvir Inês Pedrosa falar durante muito mais do que o tempo previsto sobre a Casa Pessoa, não dizendo muito de valor e roubando tempo ao Dr. Seabra Pereira, cuja participação valeu pelo video de Mariza a cantar ''Há uma musica do Povo'', uma musicalização de um poema de Fernando Pessoa, e também pelo ar atordoado dos presentes que não entenderam uma palavra do inglês atroz do Dr Seabra Pereira (à que dizê-lo com frontalidade, já dizia o outro!).
Ouvir Pessoa em inglês (e depois em Português, pela voz do Dr Seabra Pereira, num português bem melhor que o seu inglês) ao sabor de um belo vinho português, foi sem dúvida uma experiencia diferente.
Ouvir e ver reacções de ingleses (e espanhóis, que lá estavam tantos!), e perceber que também eles ficam fascinados pela obra daquele que é, na minha opinião, o melhor dos nossos poeta, é algo que com toda a certeza me alimenta a alma e me deixa um pouquinho mais orgulhosa de ser portuguesa.
Nós também fazemos coisas boas!

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

My love to you is true, a tattoo, that ain't ever coming off

(...)

Outra vez te revejo,
Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.
Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo -,
Transeunte inútil de ti e de mim,
Estrangeiro aqui como em toda a parte,
Casual na vida como na alma,
Fantasma a errar em salas de recordações,
Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem
No castelo maldito de ter que viver...

Outra vez te revejo,
Sombra que passa através das sombras, e brilha
Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,
E entra na noite como um rastro de barco se perde
Na água que deixa de se ouvir...

Outra vez te revejo,
Mas, ai, a mim não me revejo!
Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,
E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim -
Um bocado de ti e de mim!...

Álvaro de Campos
Lisbon Revisted (1926)